Isabê
A memória desempenha um papel fundamental na poética de Isabê, mas não como tema de suas imagens. Trata-se, antes, de uma função, potencializada por algumas decisões da artista, tais como o uso de uma paleta de cores reduzida, composta predominantemente de tons terrosos e verdes amarronzados que remetem às paisagens do Mato Grosso do Sul, sua terra natal; e de suportes que se assemelham a fragmentos de papel e de tela que, em sua leveza, irregularidade e aparente precariedade encarnam a fragilidade e incompletude da memória.
Essas pinturas e desenhos se precipitam em meio a uma solução feita de espaço, tempo, corpo e matéria. Cada imagem parece resultar de um encontro único e irrepetível da artista com a matéria. Em alguns destes encontros comparecem outros personagens, figuras humanas ou animais que reconhecemos ou cuja presença intuímos, e que parecem ter sido descobertas, mais do que criadas pela artista; em outros, predomina o corpo-a-corpo da artista com a matéria plástica.
O importante é que, independentemente do teor do encontro, a imagem que ele engendra é sempre, e antes de qualquer coisa, uma precipitação de espaço, tempo, corpo e matéria e, portanto, uma precipitação de vida. Margeando a figuração, as imagens de Isabê nos convidam a experimentar, sensorial e a afetivamente, as inscrições de uma gestualidade livre e informal, que desloca para uma zona cinzenta os limites entre a intenção e o acidente.