Isabê
O que percorre a linguagem de uma pintura é, sobretudo, a crueldade de seu traço. No traço da tinta, o resto de quem viveu — memórias, desejos, saudades, agonias, amores também. Em “morrer é coisa de quem vive” somos convidados, então, a perceber como a língua pode ser desimaginada, sobretudo, perceber que a língua não nos espera, encontra-se na aresta do atento flutuante. Disse Gullar que “o que um poeta faz é reinventar a vida”, esse trabalho, na exigência do lento, nos convida a morder o tempo e a vida, lambendo-os, passando as mãos em seus cabelos. Participamos, certamente, de uma nova história — não em representações, mas na inferência, no entreamento da obra e de quem a vive. Entre ruídos e fendas, Isabê consegue, em seu trabalho de estreia, a proposição de uma manutenção estética em Mato Grosso do Sul. Em seu devir, confunde-nos a margem de uma linguagem posta, não como um rejeito ao já produzido, mas uma carta ao novo, ao espanto, ao fresco, ao belo — esses que, sempre, acompanham o passado entendendo-o como o agora de um chão rachado.